terça-feira, maio 17, 2011

Para Sempre Lilya (2002)



Em algum lugar da antiga União Soviética, Lilya (Oksana Akinsjina) sonha com a possibilidade de mudar-se para os EUA. Quando a mãe dela conhece um homem pela internet e parte sozinha para o continente americano, Lilya vê-se abandonada a própria sorte. Os sonhos e a inocência da adolescência dão lugar a triste verdade de alguém que passa a usar a prostituição e as drogas para sobreviver e para fugir da realidade.

O fatalismo, concepção filosófica rebuscada para shit happens, é imperativo sobre a nossa impotência frente certos eventos da vida. Lilya, por exemplo, é uma adolescente como qualquer outra: sonhadora, carente de atenção, curiosa e sem muito interesse pelos estudos. Ela pode ter um futuro brilhante (como uma professora diz ironicamente em um momento do filme) OU não. Para Sempre Lilya recorre ao fatalismo para mostrar uma vida destruída por forças que lhe são pré -existentes e é desolador no que se propõe por fazer isso sem mostrar uma luz no fim do túnel, por reforçar a idéia de que esse tipo de coisa é NORMAL dentro de sociedades complexas.

Lilya, que começa o filme repleta de sonhos, passa por uma série desastrosa de acontecimentos que abalam sua fé em deus e na vida como um todo. Após vender o próprio corpo para comprar comida, ser enganada e abandonada, Lilya declara que “não há nada de bom no mundo” e joga fora um quadro do Santo Anjo do Senhor (ver imagem abaixo) ao qual ela costumava recorrer em momentos de dúvida e tristeza. Volodya (Artiom Bogutjarskij), único amigo da personagem, chega a dizer que a vida em si deve prevalecer sobre qualquer tipo de dificuldade, mas esse pensamento não é suficiente nem para ajudar Lilya a se conformar nem para fazer com que o espectador veja algum sinal de esperança para aqueles personagens.

Nietzsche diz no Crepúsculo dos Ídolos que o artista trágico (no caso, o diretor) “mostra justamente o estado sem temor ante o que é temível e questionável”. A citação faz-se pertinente porque, enquanto eu procurava informações sobre a produção, acabei encontrando um comentário no mínimo curioso sobre Lilya e, de um modo geral, sobre o que filmes como ele representam dentro do cinema. “Se cinema é diversão, é para nos fazer sonhar num mundo de faz de conta, qual é o motivo de fazerem um filme assim?” É perfeitamente compreensível que alguém faça esse tipo de pergunta, eu mesmo já fiz depois de ver o Funny Games. Ver a vida de modo fatalista é uma opção tão ou mais válida quanto utilizar artifícios artísticos e/ou religiosos para tornar tudo mais “fácil” de ser suportado. Ter acesso a vários pontos de vista, no entanto, ainda é uma das formas mais conscientes de escolher qual caminho seguir. Cinema não é só diversão assim como não precisa necessariamente exigir reflexões profundas. Hoje eu entendo e gosto do Funny Games, assim como adoro o polêmico filme estoniano sobre bullying Klass, mas isso só foi possível pela abertura que eu dei a filmes que fazem esse contra-ponto àqueles que transbordam bons sentimentos e diversão, como oConduzindo Miss Daisy e Thor, por exemplo.

Para Sempre Lilya é sim um filme que expõe um lado triste e sombrio da vida. Excluindo os zooms medonhos, a direção do sueco Lukas Moodyson é precisa e corajosa tanto pela forma de abordar o tema quanto pela estética onírica utilizada nas cenas finais. Se dificilmente alguém assistirá um filme assim à procura de diversão, que pelo menos seja levado em consideração a sensibilidade do diretor para expor desespero e tristeza e o poder que a consciência de tais sentimentos tem para uma compreensão satisfatória e corajosa da realidade.


Problemas? Segura na mão de deus! (Fala aí, sua avó tinha um quadro desses)

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